A
Matemática e os códigos genéticos, o poder da Matemática quando esta se baseia em
princípios biológicos sólidos. Em 1952 o Matemático inglês Alan Turing estabeleceu as
bases dos modelos matemáticos da morfogênese. Durante esse processo, a
comunicação celular é fundamental, já que esses sinais controlam os códigos
genéticos que fazem a célula modificar seu comportamento, ou mesmo sua mesma
essência, para construir ou desenhar um padrão determinado (forma, tamanho,
diferenciação histológica etc.). Turing atribuiu a formação de padrões a
mecanismos de difusão desses sinais (especificamente ao movimento aleatório dos
sinais, que aparece como resultado de interações com as moléculas do fluido
extracelular) junto com processos de reação química entre elas (ativação ou
repressão do sinal) no entorno das células.
Acima: Imagens de tecidos em desenvolvimento da mosca
da fruta ou mosca do vinagre (‘Drosophila melanogaster’), nas quais se
observam as extensões celulares (filopódios). O gráfico mostra a
simulação matemática da informação transportada no processo de
comunicação (densidade de Sonic Hedgehog).
As células falam a
linguagem da matemática?
Essa
pergunta é do texto de Isabel
Guerrero e Juan Soler, ambos discorrem sobre a
observação do poder preditivo da matemática quando esta se
baseia em princípios biológicos sólidos. Disponível em: https://brasil.elpais.com/brasil/2018/08/27/ciencia/1535378398_374917.html
Durante o desenvolvimento
embrionário como no indivíduo adulto, as células precisam saber onde estão,
quantas são, com o quais outras devem interagir e quanto precisam proliferar
para formar tecidos diferentes, com formas e tamanhos específicos. Isto exige que
conversem entre si, através da comunicação celular, que nada mais senão a
capacidade que todas as células têm de trocar informação físico-química com o
meio ambiente e com outras células para poderem agir coordenadamente.
Entretanto, ainda existem
muitas dúvidas sobre este processo: como é a comunicação entre células
adjacentes ou afastadas? Como são emitidos, recebidos e interpretados os sinais
moleculares nesta comunicação? Estariam esses sinais orientados e direcionados
para células mais predispostas à sua recepção? E a pergunta mais importante:
como podemos influir nesse processo de comunicação? A matemática é uma
ferramenta essencial para responder a essas questões de interesse biológico.
Nesta última década, o enorme avanço
das técnicas de microscopia e o desenvolvimento de ferramentas moleculares
permitiram acompanhar mais detalhadamente a dinâmica desses sinais, e graças a
isso foi possível observar uma realidade bem diferente da intuída por Turing.
O conhecimento atual nos leva a
considerar que as células se comunicam por contato direto inclusive quando se
encontram muito afastadas entre si. O processo de transferência de sinais se dá
mediante extensões retráteis da membrana celular (denominadas filopódios ou
nanotubos). A informação bioquímica a ser transmitida circula por essas
estruturas, como ocorre durante a comunicação neuronal, no que parece ser um
sistema genérico de comunicação.
A célula receptora interpreta os
sinais mediante as chamadas rotas de sinalização, às quais se associam
determinadas moléculas que agem desde início do estímulo para que as células
respondam. Essas rotas são específicas para cada sinal, e cada uma regula a
expressão de genes concretos. Entre elas, a rota de Hedgehog-Gli, na qual
focamos nossa pesquisa, é fundamental durante o desenvolvimento animal e no
crescimento tumoral. Neste processo estão envolvidos aspectos puramente
mecânicos (a dinâmica de elongação e retração de filopódios, os fatores
responsáveis pelo direcionamento da informação etc.) e aspectos moleculares,
cujo resultado perfeitamente coordenado não dá chance à aleatoriedade.
Toda essa engrenagem perfeita pode ser
modelada por equações diferenciais nas diversas escalas do processo (os tempos
de transmissão do sinal e de reação da célula são diferentes, assim como o
percurso espacial do sinal fora e dentro da célula), que permitem predizer e
aprender com sua dinâmica. Os modelos matemáticos em biologia ajudam a revelar
novos fenômenos, dinâmicas não esperadas ou padrões evolutivos, para formular e
corroborar novos experimentos, e a direcioná-los na busca por respostas.
Protótipos
Neste caso, o conhecimento básico do
micro e do nano nos possibilita estabelecer protótipos e transferi-los a uma
escala macroscópica, a do tecido ou tumor. Com esses métodos podemos saber como
se orientam os filopódios que medeiam a sinalização celular, quão específico é
o processo em cada tipo de sinal e a possibilidade de que comportamentos
celulares ou moleculares individuais derivem em um comportamento coletivo. Com
interesses terapêuticos, essa modelação é chave para estabelecer os princípios
para a identificação de novos inibidores ou promotores destas rotas de
sinalização que, quando alteradas, causam patologias.
Assim, desenvolvimentos matemáticos
como a teoria do potencial e as integrais singulares, as equações diferenciais
aplicadas ao transporte sobre filamentos, o cálculo de variações e as
propriedades de dispersão de fluxos saturados unem-se aos avanços em microscopia,
à compreensão dos mecanismos moleculares da sinalização celular baseada na
informação bioquímica e genética e ao estudo do comportamento celular coletivo.
É apaixonante observar o poder de predição da matemática quando ela se baseia
em princípios biológicos sólidos, permitindo caminhar por atalhos não
explorados da ciência e liderar novas descobertas.
Fonte: Matemático Sousa
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