Quando a
Matemática é sua inimiga na escola? Conheça
a história de duas professoras brasileiras que ajudam a mudar a educação no
país: as finalistas do 21º Prêmio Educador Nota 10.
É só falar em Matemática e muitos já
torcem o nariz, sacodem a cabeça e declaram seu desgosto pela matéria. Aos
avessos a números e cálculos, provas complicadas, fórmulas impossíveis e outros
traumas são, via de regra, associados à disciplina.
Era essa a reação que Ivonete Dezinho
via no rosto de seus alunos do 8º ano toda vez que entrava na sala. Era um
retrato de desânimo geral com a sua aula e em aprender a matéria.
O professor e Matemático
Valdivino Sousa em seu artigo: Ansiedade à matemática: principaiscaracterísticas e sintomas. Ele relata o controle aversivo presente no ensino
da matemática que pode gerar um padrão de resposta conhecido como ansiedade à
matemática, caracterizado por fuga e esquiva diante de situações que requerem o
uso de repertórios matemáticos, além de reações fisiológicas desagradáveis e
auto-atribuições negativas. Tipicamente indivíduos com ansiedade à matemática,
além da dificuldade na aprendizagem da disciplina, formam classes conceituais
nas quais estímulos matemáticos estão associados a eventos desagradáveis e
punitivos.
"A matemática não é
apenas outra linguagem: é uma linguagem mais o raciocínio, é uma linguagem mais
a lógica, é um instrumento para raciocinar", Explica Valdivino Sousa.
Como muitos antes deles que já se
formaram e têm seus empregos, os jovens se perguntavam: para quê eu vou usar
isso na vida?
Com a missão de resgatar a curiosidade
desses alunos, a professora de Naviraí, em Mato Grosso do Sul, pediu que os
alunos da EMEF Professor Milton Dias Porto procurassem nas profissões do dia a
dia como a matemática era utilizada.
Abrindo espaço para sugestões dos
alunos, Ivonete deixou que eles investigassem trabalhos pelos quais se
interessavam. Médico, chefe de cozinha e astronauta foram algumas das
profissões sugeridas e os estudantes também entrevistaram profissionais
próximos do seu cotidiano como, por exemplo, padeiros e garçons.
Após a investigação inicial, a etapa
seguinte foi na sala de informática. Os grupos fizeram exercícios para os
colegas responderem, elaborados de acordo com os desafios cotidianos em que a
matemática se faz presente. No papel de professores, eles até corrigiram e
deram as notas.
Para lidar com outro trauma, o dos
pais chamados à escola somente para ouvir reclamações, ela convidou os
responsáveis dos alunos para conhecer o projeto, se envolver no assunto e
explicar em casa como a matemática também estava em suas vidas.
“Ao longo do projeto, fui me
surpreendendo, naturalmente eles começaram a se interessar e falar de matemática no dia a dia. O fantasma
da matemática foi se dissipando.
O mais importante foi eles entenderem que é
possível aprender”, diz Ivonete. Apoio nos estudos: 6 aplicativos para
estudar Matemática
Os alunos começaram a entender como
seus pais faziam o orçamento da casa ou como cuidavam da aposentadoria. “Foram
momentos muito ricos de trocas de experiências com pais e avós, todos
aprenderam, inclusive eu. Eles trouxeram outros conhecimentos para a aula, como
o pai que calcula área sem usar a fórmula ou como o avô calcula os juros”, fala
ela.
Com esse projeto, Ivonete foi uma das
10 finalistas do prêmio Educador Nota 10 entre mais de 4 mil iniciativas em educação inscritas de todo o Brasil.
O prêmio em sua 21ª edição é uma
iniciativa do Grupo Abril em parceria com a Globo, organização da Fundação
Victor Civita e da Fundação Roberto Marinho, com apoio da Associação Nova
Escola e patrocínio da Fundação Lemann e Somos Educação.
Os ganhadores recebem um vale-presente
no valor de R$ 15 mil. Em outubro, na cerimônia de premiação em São Paulo, será
anunciado o Educador do Ano, que ganhará o prêmio adicional de R$ 15 mil.
Ivonete tem 30 anos de carreira e esse
foi seu primeiro projeto inscrito no prêmio. Ela conta que nasceu no Ceará,
filha de pais lavradores e analfabetos, que aprenderam a ler com sua irmã mais
velha.
Ela depois ensinou seus dois irmãos
mais novos a ler e escrever. “Eu os alfabetizei com carvão, onde dava, quando
foram para escola, já sabiam ler. Meus pais diziam que a única riqueza que
podiam dar para os filhos era a educação”, conta.
Pensar sozinho
A professora de São Sebastião do
Paraíso, em Minas Gerais, Elenir Novaes sempre quis dar aulas. Ela assumiu sua
primeira turma aos 16 anos e nunca mais parou de lecionar. Com 25 anos de
carreira, ela também nunca parou de estudar: tem pós-graduação em supervisão,
orientação e inspeção escolar e em psicopedagogia.
Sua maior inspiração é a mãe, Luzia
Maria Jesus Oliveira. “Ela ensinava cinco séries juntas em uma sala só, dava
conta de tudo. No tempo dela, não tinha quem ajudasse na merenda e ela mesma
tinha que fazer o lanche dos alunos”, conta.
Na mãe, ela viu a influência que um
educador pode ter na comunidade e como ela inspirava os jovens a pensar de
formas diferentes.
Esse foi o desafio assumido com seus
alunos de 8 anos, na Escola Municipal Campos do Amaral, que passavam mais tempo
desenhando os números do que pensando na solução de problemas matemáticos.
Com seu projeto “De cor e salteado”,
Elenir também se tornou uma das 10 finalistas do Educador Nota 10 de 2018.
Assim como Ivonete, ela precisava ligar o conteúdo da sala de aula com o uso
prático da matemática.
Seu objetivo era que seus alunos se
apropriassem de estratégias de pensamento lógico para resolução de problemas.
Para isso, ela desenvolveu exercícios que exigiam raciocínio e eles deveriam
apresentar caminhos diferentes para a solução.
Ela introduziu a ideia de
“sobrecontagem”, por exemplo, em que o aluno realiza a soma a partir do número
de maior valor. Nos jogos e atividades, até a calculadora estava liberada, o importante
era desmembrar o processo matemático.
Muitas vezes, a solução de um
problema, como a resistência ao aprendizado da matemática, não é tão complexa.
É necessário o trabalho, como o da professora mineira, de diagnosticar a
dificuldade e agir com os recursos disponíveis. Acima de tudo, o professor
ensina a pensar, e faz toda a diferença.
“Fiquei contente quando eles começaram
a compartilhar esse conhecimento com a outra turma. Tive que preparar uma
atividade para que ajudassem os amigos. E outras crianças começaram a
tirar a dúvida com eles”, diz.
Para ela, a premiação foi a coroação
de anos de persistência dedicados à educação.
“No momento em que nos encontramos no
país, o reconhecimento do professor se faz necessário. Muitos fazem trabalhos
brilhantes, mas sem valorização, nem na escola ou na secretaria. A organização
desse prêmio contribui para a melhoria da educação. Ele traz um consolo
profissional, de que alguém está percebendo que você faz a diferença onde
está”, confessa Elenir.
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